Cada vez percebo que é mais importante conhecer os mecanismos de funcionamento do varejo, mesmo para quem não atua diretamente com esse setor. Sua dinâmica faz com que táticas, e muitas vezes estratégias, tenham que ser revistas do dia para a noite, ou melhor, da noite para o dia, literalmente, pois cada dia de metas não alcançadas não voltará mais. É preciso acordar mais cedo, ler os jornais com todos os anúncios da concorrência, avaliar preços e promoções, checar a distribuição e o abastecimento das lojas, negociar preços e volumes com fornecedores, alterar linhas de produtos, e tudo isso DIARIAMENTE…
Para quem não conhece esse ritmo é realmente difícil compreender a absurda velocidade com que tudo deve ser feito nesse setor da economia. Ainda mais se pensarmos na diversificação de formatos existentes: shopping centers, supermercados, lojas de rua, comércio eletrônico, call centers, venda porta a porta, home centers, concessionárias de veículos e se for incluído o varejo de serviços, deveremos considerar também os bancos de varejo e financeiras. Todos esses setores faturaram mais de R$ 600 bilhões em 2006.
Além da força decorrente do tamanho desse setor, há ainda o poder gerado pela atual concentração verificada, tanto no segmento supermercadista, como no bancário, onde cada vez mais um faturamento gigantesco se concentra nas mãos de poucos grupos. Isso conduz a pesadas negociações travadas entre varejo e indústria, muitas vezes, mediadas por suas áreas de trade marketing, mas que, sem dúvida, têm levado a uma grande disputa de forças, que no passado era normalmente vencida pela indústria, mas que hoje em dia tem se modificado bastante. Basta lembrar o faturamento que somente o setor supermercadista obteve em 2006, com mais de R$ 124 bilhões, segundo a ABRAS.
Outro fator de grande relevância é o percentual de decisões tomadas no ponto de venda, ou seja, mais de 66% dos consumidores informam-se na própria loja sobre os produtos que pretendem comprar (Fukushima & Muller, 2008).
Consciente dessa importância, o varejo tem se preparado mais e mais no sentido de levar ao consumidor experiências relevantes de compras, pois conhece de perto o comportamento e as necessidades da população que costuma atender, porque não se limita aos aspectos sócio-demográficos que os teóricos utilizam. Busca, assim, elevar a auto-estima e conduzir à inclusão, no caso das redes voltadas ao atendimento das classes mais populares, ou então procura demonstrar total exclusividade, no caso das lojas destinadas ao atendimento do público de luxo, ou seja, a base e o topo da pirâmide, respectivamente.
Falando nisso, por estar mais perto do consumidor, o varejo foi o primeiro a detectar as enormes oportunidades para se comunicar melhor e atender essa massa gigantesca e ascendente, chamada de nova classe média, que segundo dados da FGV (2008) totalizam hoje mais da metade da população (51,8%) e recebe uma renda entre R$ 1.064 e R$ 4.591 por mês. Esse público precisa de uma comunicação simples, direta e objetiva, ao contrário do que ainda fazem algumas agências de publicidade.
Nessa busca por satisfazer os anseios dos seus respectivos públicos podemos observar um elevado grau de criatividade na oferta de serviços complementares, com soluções para adequação de preços e financiamentos, na exploração de novos canais de atendimento e na melhor localização de suas lojas, por parte do varejo.
Toda essa movimentação e modernização podem ser consideradas muito recentes, pois não tem mais de 15 a 20 anos. E isso inclusive afeta diversos outros setores, como o de educação, por exemplo, pois há 20 anos são se percebia grande interesse dos alunos em se voltarem para uma atuação no varejo, e nem havia cursos especialmente voltados para entender e atender esse setor. Algo bastante diferente do que se percebe hoje em dia, quando as principais escolas de negócios do país desenvolvem esse tema à exaustão.
A preocupação da indústria também é pertinente se analisarmos a perda de lealdade às marcas tradicionais, que se deve a diversos fatores, como preço, busca por experimentação e, como foi dito acima, à própria atuação nos pontos de venda por parte de diversos fornecedores, que pode seduzir o consumidor no momento da compra, levando-o a decidir por outra marca. Essas mudanças têm conduzido alguns fabricantes a investirem mais em promoções nas lojas do que em campanhas nos grandes veículos de comunicação, o que faz com que se repensem as velhas fórmulas para construção de marcas.
(artigo publicado na Gazeta Mercantil – outubro / 2008)